Há cerca de dois meses, a pequena rua Gomes Ornelas, num bairro pobre da cidade de Formosa (GO), recebeu a visita de uma antiga moradora, que há pelo menos sete anos se mudou com a família para a Espanha.
Ela trazia notícias sobre o casamento de uma das filhas, falou como ainda estava conseguindo se virar longe do Brasil e, em tom bem humorado, contou hábitos de seu filho caçula, que estava andando com "panos amarrados" na cabeça, usando "batinas" e frequentando uma "igreja" não cristã, que, em sua visão, pelo menos o protegia das más influências.
Na semana passada, notícias do caçula voltaram a ser comentadas na Gomes Ornelas. Dessa vez, não foram dadas pela mãe do rapaz, Amaurinda Ribeiro, mas pela imprensa internacional, informando que um brasileiro de 18 anos havia sido preso com dois colegas na Bulgária tentando chegar até a Síria.
Lá, segundo autoridades, "Hakim", ou Kaíque Ribeiro, iria ingressar nas fileiras do Estado Islâmico. Ele, que nega a acusação, deve ser extraditado para a Espanha.
Parentes e vizinhos disseram à Folha que estão surpresos com a prisão.
Lembram do menino que cresceu brincando com os primos e jogando bola.
"Ele era muito bonito, educado, ia para a escola e brincava pouco na calçada, ficava mais na casa dele ou na dos primos, do outro lado da rua. O irmão mais velho, que também foi para Europa, voltou e ainda mora na casa da família. Ele é solteiro mas não fica fazendo festa. É um pessoal de bem", disse a aposentada Aironi dos Santos, 66, antiga vizinha de Kaíque.
Na casa em que morou, a reportagem não conseguiu localizar o irmão. Por telefone, ele disse que não iria se pronunciar sobre o episódio.
A cerca de 50 metros, numa cadeira na porta de seu comércio, Lurdes da Silva, 52, fez um relato semelhante.
Segundo ela, quando Kaíque brincava era sempre em frente a sua residência, pois a mãe, muito rígida com a educação dos filhos, tinha receio de que o menino se envolvesse com drogas ou "coisas erradas".
A prima Wandilei Santana, 40, que mora em frente à antiga casa de Kaíque, fez diversos elogios ao garoto, que brincava muito com seus filhos. Apesar de ter perdido o contato com o menino quando ele viajou para Espanha, disse que recebia notícias, sempre informada por Amaurinda que tudo estava bem.
Filho mais novo de uma família de quatro pessoas, ele morava na Catalunha com a mãe e o padrasto.
Alan Marques/ Folhapress | ||
Foto sem data de Kaíque Ribeiro durante a infância |
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Na visita há cerca de dois meses, quando falou com a irmã, Wandilei ficou sabendo de um único episódio que quebrava a normalidade.
Irritada com o filho demorando numa praça na Espanha, Amaurinda foi até o garoto, que estava com dois amigos, e lhe levou para casa sob bofetadas. "Ele estava andando com colegas de que ela não gostava. Mas, depois disso, disse que ele voltou a ficar bem", contou.
Foi nesta mesma conversa que Amaurinda falou de maneira equivocada sobre as roupas que fazem parte da cultura islâmica, referindo-se também à mesquita como uma "igreja".
Questionada sobre a religião da família de Kaíque, Wandilei disse que esporadicamente eles frequentavam uma igreja evangélica da cidade goiana.
FOLHA.COM
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