segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Governo do RN pode sofrer intervenção federal se descumprir repasse para TJ

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu: o Poder Executivo (Governo do Estado) tem que repassar, integralmente, o duodécimo ao Judiciário (Tribunal de Justiça do RN). Não, a decisão não é antiga. É nova. E se fez necessária devido ao descumprimento por parte do Governo do Estado, que alegou ter ficado “em dúvida” sobre o que o ministro Ricardo Lewandowski havia decidido na semana passada.
Por isso, desta vez, em despacho preferido nesta sexta-feira, o ministro explicou que estava reafirmando a decisão para que “não paire eventual dúvida”. Sem dúvidas, então, quanto ao que o STF determinou, o Executivo terá que cumprir o repasse imediatamente. Caso não o faça e continue protelando o pagamento de recursos que são, constitucionalmente, de direito do Judiciário, o Governo Rosalba Ciarlini poderá sofrer, até mesmo, intervenção federal.
Claro que essa seria uma medida extrema, quando estivessem esgotadas outras possibilidades, como o simples bloqueio de verba para garantir o repasse. “É possível, mas no momento acredito ser cedo para falar nisso. Há outras medidas que o STF pode tomar para garantir o pagamento, entre elas, o bloqueio de verbas”, explicou a presidente da Associação dos Magistrados do RN (Amarn), Hadja Rayanne.
Porém, é importante ressaltar que esse não é o único risco que o Governo Rosalba Ciarlini tem de sofrer intervenção federal, que seria configurada pelo afastamento da atual gestão do poder e a nomeação de um interventor para tomar decisões administrativas. Em abril, por exemplo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) fez uma série de recomendações ao Governo do Estado para mudar a condição “desumana e caótica” dos presídios estaduais. Caso essas recomendações continuem a ser descumpridas (já foram com relação ao ano passado), o Governo pode ser denunciado a Organização dos Estados Americanos (OEA) ou aos tribunais internacionais, e os processos resultarem numa interdição.
Além disso, no início do ano, o Sindicato dos Servidores da Administração Indireta (Sinai), denunciou ao Tribunal de Justiça o descumprimento da decisão judicial quanto ao pagamento do Plano de Cargos e Salários dos servidores da Fundação José Augusto pelo Governo do RN. E no pedido da assessoria jurídica do Sinai, foi requisitado ao Supremo Tribunal Federal (STF) intervenção da União Federal no RN por desobediência a ordem e decisão judicial.
DUODÉCIMO
De qualquer forma, o risco da vez, para o Executivo é o cumprimento do duodécimo. “Como o ministro colocou que a decisão deve ser cumprida imediatamente, entendo que o repasse deva ser feito em 24 horas”, analisou Hadja Rayanne. Depois desse prazo, o Governo do Estado já estaria descumprindo uma decisão e sujeito a outras punições.
Sobretudo, porque a situação não é nova, mas tem ocorrido de maneira mais frequente desde que o Judiciário passou a ter o chamado “orçamento real”, que em tese o faria não precisar de suplementação orçamentária para pagar sua folha, custear sua estrutura e fazer investimentos. “No ano passado já enfrentamos uma situação como essa e neste ano, antes de julho, o Executivo já não vinha fazendo o repasse integral do duodécimo. Ou seja: antes de cortar linearmente de 10,74% do orçamento do Judiciário, o repasse já não era integral”, revelou Hadja Rayanne.
Diante do agravamento da situação, o Judiciário decidiu recorrer ao STF. Ganhou na semana passada com uma decisão liminar, mas a Procuradoria-geral do Estado (PGE), afirmou que não tinha decidido a sentença direito. Compreendeu que o ministro Ricardo Lewandowski determinava que o repasse deveria ser feito respeitando os cortes orçamentários propostos pelo Executivo.
Agora, o ministro decidiu novamente, para evitar qualquer dupla interpretação. “Consigno, oportunamente, para que não paire eventual dúvida a respeito de seu preciso alcance, que o provimento liminar exarado em 23/8/2013 é expresso e incondicional na determinação mandamental de que a autoridade impetrada, no estrito cumprimento das normas constitucionais em questão (arts. 99 e 168 da CF), entregue os respectivos valores de duodécimos em sua integralidade, tal como destinado ao Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte na Lei Orçamentária Anual vigente naquela unidade federada (Lei Estadual 9.692/2013)”, escreveu Lewandowski.

“Corte foi baseado em uma previsão de frustração de receita”
O problema do Judiciário potiguar em aceitar o decreto do Executivo que determinou o corte linear de 10,74% no orçamento dos demais poderes e órgãos auxiliares (Ministério Público do RN e Tribunal de Contas do Estado), não é consequência, apenas, da compreensão de ilegalidade e inconstitucionalidade da medida. É resultado, também, da justificativa dada pelo Governo do Estado para realizar essa redução: a frustração de receita.
“No ano passado, o Governo do Estado afirmava que havia uma frustração de receita e o ano terminou com 100,4% das receitas previstas, realizadas. Todo ano acontece uma queda na arrecadação durante o ano. É normal, temos até estudos relacionados a isso. E o que o Governo está fazendo e fazer os cortes baseados numa previsão de frustração de receita e não no que já foi reduzido até agora”, explicou a presidente da Associação dos Magistrados do RN, Hadja Rayanne.
Essa “adequação” do orçamento geral do Estado determinada pelo Executivo, segundo o secretário estadual de Planejamento e Finanças, Obery Rodrigues, é resultante de uma frustração do que se planejava arrecadar durante o ano, sobretudo, nas duas principais fontes de receita: o ICMS e o Fundo de Participação dos Estados (FPE).
Contudo, pelo menos com relação ao imposto, a previsão do Sindicato dos Auditores Fiscais do RN (Sindifern), divulgada nesta sexta-feira pel’O Jornal de Hoje, a previsão é que a arrecadação de ICMS seja maior neste segundo semestre, chegando a um percentual de 15% com relação ao mesmo que foi arrecadado em 2012.
Isso porque apesar da previsão do Estado, o segundo semestre é tradicionalmente melhor para a economia pública, devido a maior movimentação do comércio. No RN, por exemplo, as duas melhores épocas para vendas acontecem nos últimos seis meses do ano: o Liquida Natal e as festas de final de ano.
Independentemente disso, o fato é que o corte linear de 10,74% comprometeu consideravelmente as ações do Judiciário. “Cortou 100% do custeio, 100% do investimento e ainda atingiu a folha salarial. Recebo ligações constantes das pessoas perguntando se o pagamento será feito, se está garantido”, explicou Hadja Rayanne.
Além da situação de insegurança para os servidores, os cortes orçamentários do TJ comprometeram, também, ações importantes do Judiciário potiguar, como os mutirões, a construção de novos prédios e a realização do esperado concurso público. “Até o processo judicial eletrônico, que nos ajudaria a reduzir a carência de pessoal do Judiciário, foi comprometido com esse corte, porque é um projeto que necessita de investimento”, afirmou. (CM)

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