domingo, 10 de novembro de 2013

LAGOA SALGADA/RN LEIA CONTEÚDO DO PROCESSO QUE SERA JULGADO PELO TRE, NO PRÓXIMO 14/11



DECISÃO



Recebo o recurso interposto no efeito devolutivo.

Intime-se a parte recorrida para que apresente contra-razões, no prazo legal.

Decorrido o prazo legal, retornem os autos conclusos.

Monte Alegre/RN, 27 de junho de 2013.

Marcos José Sampaio de Freitas Júnior

Juiz Eleitoral
Sentença em 21/06/2013 - RE Nº 153982 MARCOS JOSÉ SAMPAIO DE FREITAS JÚNIOR
- SENTENÇA -







I - RELATÓRIO



Trata-se de REPRESENTAÇÃO ELEITORAL promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL em desfavor de ALEXANDRE JOSÉ DA SILVA FREIRE, JANÍLSON DANTAS FREIRE e da COLIGAÇÃO VITÓRIA DO POVO.

Afirma-se, em síntese, que após o resultado pleito, no qual os demandados saíram eleitos com menos de 50% dos votos válidos, o candidato representante começou a receber relatos de populares relativos à compra de votos por parte dos representados, o que corroborou para colher os depoimentos no 2.º Ofício de notas de Santo Antônio/RN, local isento, livre da interferência do poder local e que possui fé de ofício.

Alega-se que, em virtude do crescimento da campanha dos representantes, os candidatos da coligação representada passaram a intensificar as doações financeiras em troca de votos, com o único intuito de ganhar as eleições a qualquer custo, de que são exemplos os casos narrados.

Relata-se que: a) o Sr. Manoel Pedro da Silva declarou ter recebido e aceitado, em 25/08/12, proposta de compra de seu voto em troca de R$ 500,00 feita pelo candidato a Prefeito representado; b) o eleitor Márcio Silva Lins declarou que, na mesma data, recebeu o candidato a Prefeito representado, que estava acompanhado de familiares dele e recebeu promessa de R$ 2.000,00 em troca de voto, recebendo, no dia seguinte, R$ 1.000,00 e a promessa de mais R$ 1.000,00 no dia 30 de setembro; c) a cidadã Maria da Solidadi da Silva Ferreira afirmou que, no mês de agosto/2012, estava em casa quando, por volta das 13 horas, chegou o Prefeito, candidato à reeleição, junto com assessores de campanha, tendo ele oferecido R$ 800,00 para que ela afixasse a bandeira dele na casa dela, o que ela aceitou, recebendo R$ 40,00 na hora e R$ 800,00 depois; d) o eleitor Francisco Maristote Silva dos Santos relatou que, no início de setembro, estava em casa quando chegou o Prefeito e perguntou quanto queria para votar nele, ao que respondeu que daria o voto em troca do pagamento do emplacamento de sua moto, sendo que, então, o Prefeito perguntou quanto custaria e, diante da informação de que custaria R$ 430,00, deu-lhe R$ 400,00 na mesma hora e disse-lhe: "agora, vote no 40" ; após a eleição, foi abordado pelo pai do candidato, conhecido por "Dedé" Justino, que lhe disse para devolver os R$ 400,00, pois não tinha votado no representado Alexandre.

Salienta-se que a eleição foi decidida por maioria de apenas 40 votos, correspondentes a 0,54% dos votos válidos.

Requereu-se a cassação do registro/diploma/mandato dos representados, bem como a declaração de inelegibilidade deles, com a imediata diplomação e posse dos representantes, vez que estes e os demais candidatos vencidos obtiveram, somados, mais de 50% dos votos válidos.

Juntaram-se os documentos de fls. 13/31.

Notificados, os representado apresentaram defesa às fls. 37/54, na qual alegaram, preliminarmente, que haveria irregularidade na representação do PMDB. No mérito, salientam que as "declarações" anexadas, prestadas em cartório extrajudicial, não constituem prova idônea.

Salientam também que: a) os eleitores afirmam que tiveram seus votos comprados entre 25 de agosto e 15 de setembro, mas suas consciências só os forçaram a denunciar o esquema em 30 de outubro, mas não à Polícia, ao Ministério Público ou à Justiça, e sim aos representantes; b) não há como presumir a boa-fé de pessoas que, todas juntas, em um mesmo dia, se dirigem a um cartório e "confessam" o cometimento de um crime eleitoral; c) em nenhum momento da campanha foi ajuizada representação contra os representados, tendo surgido tal interesse moral dos representantes após serem derrotados no pleito eleitoral; d) os fatos imputados aos representados jamais ocorreram; e) as testemunhas que deram as declarações anexadas não merecem fé, sendo que Márcio Silva Lins é partidário dos representantes, tendo pintado o muro de sua própria casa com o número 15, ao passo que a mãe de Francisco Maristote Silva dos Santos gravou relato em que afirma que os representados jamais estiveram em sua casa para aliciar seu filho, e os dois demais deram depoimentos genéricos e lacônicos, nitidamente ditados pelos interessados.

Pediram pela extinção do feito sem resolução do mérito, em face do vício de representação, bem como a improcedência dos pedidos feitos pelo Ministério Público. Anexaram os documentos de fls. 57/75.

Após parecer ministerial, a preliminar suscitada foi rejeitada por decisão de fl. 87.

Realizada audiência de instrução em 21/05/2013 (fls. 89/95), ocasião em que foi novamente suscitado vício de representação processual dos demandantes, o que foi mais uma vez rejeitado por este Juízo Eleitoral, seguindo-se a inquirição de três das testemunhas arroladas na inicial, ausente a testemunha Manoel Pedro da Silva, após o quê os representados dispensaram as testemunhas que haviam arrolado e requereram diligências, as quais, após manifestação da parte contrária e do MPE, foram indeferidas.

Aberto prazo comum para alegações finais, foram anexadas as manifestações dos representados (fls. 112/124) - em que se argumenta que as versões narradas pelas testemunhas são inverossímeis e incompatíveis, pugnando pela improcedência da representação - e pelos representantes (fls. 125/132), em que se afirma que a prova testemunhal confirmou as práticas de captação de sufrágio, pedindo-se pela procedência dos pedidos feitos na inicial.

O Ministério Público Eleitoral emitiu o parecer de fls. 133/139, pela procedência dos pedidos feitos na inicial.

É o relatório. Fundamento e decido.





II - FUNDAMENTAÇÃO



Cumpre efetuar a análise dos fatos sob o prisma do art. 41-A da Lei n.º 9.504/97. Tem-se que o dispositivo legal em questão é de seguinte redação:



Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990.



De acordo com a regra legal, o sujeito ativo da infração é o candidato. Isso não quer dizer que só haverá punição ao candidato se ele agir pessoalmente. Predomina o entendimento de que poderá haver responsabilização do candidato sempre que concorrer direta ou indiretamente para a prática ilícita. Não fosse assim, o dispositivo legal seria letra morta, pois costumeiramente se delegam as atividades ilegais de compra de votos a cabos eleitorais e correligionários. Tratando dessa questão, o Tribunal Superior Eleitoral assentou que resta caracterizada a captação de sufrágio prevista no dispositivo acima transcrito quando o candidato praticar, participar ou mesmo anuir explicitamente às condutas abusivas e ilícitas capituladas naquele artigo.

O sujeito passivo é o eleitor. Cabe assinalar que, conforme entendimento jurisprudencial majoritário, estando comprovada a prática de captação ilegal de sufrágio, não é imprescindível que sejam identificados os eleitores que receberam benesses em troca de voto.

Destaque-se também que, para haver multa e a cassação do registro ou diploma, são necessários os seguintes elementos: a) elemento subjetivo, qual seja, a intenção de captar votos; b) elemento objetivo consistente em dar, oferecer, prometer ou entregar bem ou qualquer vantagem de cunho pessoal, inclusive emprego ou função pública, salvo as exceções legais previstas no art. 26 da Lei nº 9.504/97 (distribuição de material de propaganda eleitoral permitida).

Por outro lado, deve ser registrado, por relevante, que a melhor jurisprudência do TSE não exige a chamada potencialidade lesiva em demandas dessa natureza, isso porque o bem protegido pelo artigo 41-A é a vontade do eleitor e não o resultado da eleição. A Ministra ELLEN GRACIE NORTHFLEET, ao julgar recurso especial eleitoral no feito nº 21169, em 23.10.2003, abordou com maestria a questão, ponderando que "a captação ilícita de sufrágio, tipificada no artigo 41-A da Lei nº 9.504/97, configura-se com a ação delitiva do agente tendente a influenciar a vontade de um único eleitor, diferentemente do abuso de poder econômico, que exige potencialidade tendente a afetar o resultado de todo o pleito". Nessa mesma linha decidiu a Corte Eleitoral em diversos outros feitos, entre eles, o Processo nº 1083 MC - MEDIDA CAUTELAR, em que restou confirmado que "a captação de sufrágio reprimível pelo artigo 41-A da Lei nº 9.504/97 prescinde do nexo de causalidade entre a prática ilícita e o comprometimento da legitimidade das eleições ou mesmo da potencialidade para influenciar no resultado do pleito, a exemplo do que se passa com o abuso do poder econômico".

Também não se exige que haja pedido explícito de votos, entendimento proclamado há tempos pela jurisprudência - do que dá exemplo o julgado pelo TSE no RESPE n.º 25.821/SP, Rel. Min. Cézar Peluso, DJ 07/12/2007 - e que foi positivado com a Lei n.º 12.034/2009, que adicionou ao art. 41-A o § 1.º, dispondo: "Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no fim especial de agir" .

Outrossim, em relação a esse "fim especial de agir" , importante ter em conta a orientação jurisprudencial enunciada pelo TSE no julgamento do RESPE n.º 25.146/RJ, Rel. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, DJ 20/04/2006:



CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO - CONFIGURAÇÃO - ARTIGO 41-A DA LEI n.º 9.504/97. Verificado um dos núcleos do artigo 41-A da Lei n.º 9.504/97 - doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza - no período crítico compreendido do registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, presume-se o objetivo de obter voto, sendo desnecessária a prova visando a demonstrar tal resultado. Presume-se o que normalmente ocorre, sendo excepcional a solidariedade no campo econômico, a filantropria.



No presente caso, foram narrados na inicial quatro episódios envolvendo eleitores diferentes, casos esses nos quais estaria caracterizada a captação ilícita de sufrágio.

Cumpre destacar inicialmente que a jurisprudência reconhece como possível a prova exclusivamente testemunhal - desde que harmônica e coerente - como suporte para uma condenação nas penas do art. 41-A da Lei n.º 9.504/97, do que dão exemplos os seguintes julgados do TSE:



¿Agravo regimental. Agravo de instrumento. Recurso especial. Ação de investigação judicial eleitoral. Abuso do poder político e econômico. Captação ilícita de sufrágio. Prova exclusivamente testemunhal. Admissibilidade. Sentença proferida antes da publicação do acórdão que julgou a exceção de suspeição. Art. 306 do CPC. Nulidade. Inocorrência. Fundamento inatacado. Súmula nº 182/STJ. Indeferimento. Diligências protelatórias. Juízo discricionário do julgador. Reexame.Impossibilidade. Desprovimento. 1. O entendimento deste Tribunal é pacífico no sentido de que "a comprovação da captação ilícita de sufrágio lastreada exclusivamente em prova testemunhal é perfeitamente admitida, bastando que ela demonstre, de maneira consistente, a ocorrência do ilícito eleitoral" (AgR-REspe nº 26.110/MT, rel. Min. Arnaldo Versiani, DJE de 23.6.2010). [...] 6. Agravo regimental desprovido."

(Ac. de 25.8.2011 no AgR-AI nº 234666, rel. Min. Marcelo Ribeiro.) 



"Captação ilícita de sufrágio. Prova testemunhal. 1. A captação ilícita de sufrágio pode ser comprovada por meio de prova testemunhal, desde que demonstrada, de maneira consistente, a ocorrência do ilícito eleitoral. 2. Assentando o acórdão regional que testemunha confirmou em juízo as declarações prestadas no Ministério Público no sentido de que o candidato a prefeito teria diretamente cooptado seu voto, na fila de votação, mediante pagamento de quantia em dinheiro e oferta de emprego, deve ser reconhecida a prática do ilícito previsto no art. 41-A da Lei no 9.504/97. [...]"

(Ac. de 21.6.2011 no AgR-REspe nº 29776, rel. Min. Arnaldo Versiani.) 



¿Representação. Captação ilícita de sufrágio. 1. A comprovação da captação ilícita de sufrágio lastreada exclusivamente em prova testemunhal é perfeitamente admitida, bastando que ela demonstre, de maneira consistente, a ocorrência do ilícito eleitoral. 2. A circunstância de cada fato alusivo à compra de voto ter sido confirmada por uma única testemunha não retira a credibilidade, nem a validade da prova, que deve ser aferida pelo julgador. 3. O fato de as testemunhas terem prestado depoimento anteriormente no Ministério Público Eleitoral ou registrado boletins de ocorrência perante delegacia policial, não as tornam, por si, suspeitas, uma vez que os depoimentos foram confirmados em juízo, de acordo com os princípios da ampla defesa e do devido processo legal. 4. Para afastar a conclusão do Tribunal Regional Eleitoral, de que a prática de captação ilícita de sufrágio relativa a vários fatos ficou comprovada por meio de testemunhos e que tais depoimentos não estariam viciados por nenhum interesse e seriam aptos à comprovação do ilícito, seria necessário o reexame de fatos e provas, o que é vedado nesta instância especial, a teor do Enunciado nº 279 da Súmula de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental a que se nega provimento."

(Ac. de 20.5.2010 no AgR-REspe nº 26110, rel. Min. Arnaldo Versiani.) 



Em relação ao fato que teria supostamente envolvido a pessoa de Manoel Pedro da Silva, tem-se que a única prova produzida foi a "declaração" de fl. 17, prestada perante o Tabelião do 2.º Ofício de Notas de Santo Antônio/RN. Arrolado como testemunha, referido cidadão não compareceu à audiência, do que resultou a preclusão da oportunidade de sua inquirição.

Diante disso, quanto a esse eleitor específico, claramente não há como se considerar provado de forma robusta o fato alegado. O documento anexado, produzido em sede de cartório extrajudicial, prova apenas que o eleitor deu a declaração, mas não que o conteúdo desta seja verdadeiro, a teor do disposto pelos arts. 219, parágrafo único, do CC/2002 e 368, parágrafo único, do CPC.

Passa-se agora à análise dos fatos envolvendo eleitores que efetivamente foram inquiridos como testemunhas em juízo, a começar por Márcio Silva Lins.

Os representantes sustentam que tal depoimento confirmou cabalmente a prática de entregar e prometer dinheiro em troca de voto pelo representado Alexandre José da Silva Freire, no que são acompanhados pelo parecer ministerial. Já os representados destacam que a testemunha foi muito contraditória em relação ao porquê de sua casa ter sido pintada com o número "15" durante a campanha, assim como no que concerne ao local e circunstâncias da suposta entrega do dinheiro.

Pois bem. De fato, os problemas apontados pelos representados existem. Primeiro, em relação às explicações sobre o motivo e as circunstâncias da pintura do número "15" - do partido dos representantes - que inclusive, levaram este magistrado a estado de perplexidade sobre a questão, pedindo explicações sobre a narrativa feita pela testemunha (22min40s, 23min40s e 28min20s). E, com efeito, há de se ter em conta que se trata a tal pintura de fato que acaba tendo relação direta com o objeto da demanda, cuja importância não concerne apenas à aferição de vínculo partidário ou político da testemunha com os representantes, para fins de constatação da existência ou não de interesse na causa, importando também, como se verá adiante, para o entendimento da própria cronologia dos acontecimentos.

O fato é que a testemunha, diante dos questionamentos, indicou a seguinte sequência de fatos: primeiro recebeu o dinheiro, pintou o número "40" na casa, em seguida, uns vinte dias depois, diante do descumprimento da promessa de entrega de mais dinheiro, apagou a pintura, foi morar em outra casa, sua sogra passou a ocupar o imóvel, foi feita a pintura do número "15" , depois o depoente voltou a residir na casa e apagou o número "15" , tudo antes do dia da eleição (28min50s-29min30s).

Ocorre que esse relato é incompatível com a versão declarada pela testemunha em cartório (fl. 21) e com passagem de seu depoimento em juízo (17min20s), em que relatou que a promessa que recebera era de que o restante do dinheiro seria pago "no dia 30 de setembro" , e que na referida data não foi cumprido o combinado (18min05s-18min40s, 33min12s). Ora, se o descumprimento do combinado ocorreu em 30 de setembro, é impossível que depois disso, e antes do dia da eleição, 07 de outubro, o depoente tenha ido morar em outra casa, sua sogra tenha passado a ocupar o imóvel, tenha ela feito ou autorizado a pintura do número "15" e depois o depoente tenha voltado a residir na casa e apagado o número "15" . Especialmente tendo em conta que o depoente afirmou que sua sogra passou cerca de quinze dias na casa, antes de ele retornar ao imóvel, tudo antes da eleição (34min35s).

Prosseguindo, tem-se que, no que concerne às circunstâncias da compra de votos alegada na inicial, a testemunha relatou em juízo que recebeu o dinheiro "da mão do pai dele" , Sr. "Dedé Justino" , sendo que este estava acompanhado das pessoas de "Pedro Vovô" e "Batista de Beija" (20min46s), "na casa em que eles 'tava organizando a campanha'" (21min17s), o que foi confirmado com detalhes quando das perguntas formuladas pelo Ministério Público. Nesse momento, (a partir dos 45min40s), é explicado que o "negócio" foi fechado em sua casa, no dia seguinte à visita do Prefeito, por anúncio de "Pedro Vovô" e "Batista de Beija" das condições do pagamento, seguindo-se à ida do depoente à casa "na rua principal, na residência do ex-prefeito José Carlos" , onde recebeu a primeira parcela prometida do dinheiro.

São passagens sem dúvida contundentes. O problema é que tais circunstâncias divergem daquelas descritas no Cartório Extrajudicial (fl. 21). Lá, havia sido dito que "no dia seguinte o prefeito Alexandre Justino voltou a casa do declarante e disse que concordou com a proposta do mesmo, entregando-lhe R$ 1.000,00 no ato, e prometendo que o restante do dinheiro pagaria no dia 30 de setembro do corrente" . E a testemunha confirmou em juízo que realmente dissera isso no cartório, nada tendo a corrigir (32min48s e 33min08s).

Conclui-se que há contradições sérias que impedem que o depoimento testemunhal seja reputado hábil a provar, fora de dúvidas, a captação de sufrágio noticiada. Embora se saiba que algum grau de imprecisão seja inerente à prova testemunhal, aqui o que se tem são informações conflitantes sobre as circunstâncias centrais dos fatos de uma relevância tal que não podem ser simplesmente desconsideradas. Até porque não é possível vislumbrar uma explicação clara para as divergências. Por que a testemunha falou no cartório que recebeu o dinheiro em sua própria casa, da mão do Prefeito, e em juízo relatou que o local do recebimento do dinheiro foi o comitê do candidato e que quem efetuou a entrega foi o pai do Prefeito sem fazer qualquer referência à presença do Prefeito? Não é possível saber, e na falta de um início de prova material acerca do fato, essas incoerências ganham projeção.

Passa-se agora a analisar a imputação envolvendo a pessoa de Francisco Maristote Silva dos Santos.

Os representantes sustentam mais uma vez que tal depoimento confirmou cabalmente a prática de entregar e prometer dinheiro em troca de voto pelo representado Alexandre José da Silva Freire, no que são acompanhados pelo parecer ministerial. Já os representados defendem novamente haver contradições sérias no depoimento prestado.

Trata-se do caso mais difícil de todos, de uma complexidade ímpar. Isso porque a narrativa da testemunha é coerente, não apresenta lacunas ou obscuridades, e é perfeitamente harmônico com o teor das declarações dadas no cartório extrajudicial (fl. 29). Além disso, revela com franqueza a participação do candidato representante na tomada do depoimento no 2.º Ofício de Notas de Santo Antônio, bem como que foi levado ao referido estabelecimento pelo irmão do referido candidato. Em nenhum momento o depoimento deixa a sensação de que algo está sendo escondido; as respostas são sempre dadas de forma clara e simples.

Vê-se que a testemunha relatou que recebeu R$ 400,00 das mãos do Prefeito, em troca de voto, no mês de setembro, para serem usados no emplacamento de sua moto, tendo exibido espontaneamente os documentos que comprovariam tal pagamento, cujas cópias foram então anexadas aos autos (10min20s, fls. 96/98).

Ocorre que os comprovantes em questão são datados de 04 de agosto de 2012, havendo, portanto, contradição flagrante entre as datas. Até se pode considerar, sob certo prisma, que dada a condição sócio-cultural da testemunha - pessoa nitidamente muito simples e de pouca instrução formal - seria admissível a confusão de um mês para o outro. Entretanto, duas outras passagens de seu depoimento agravam a contradição severamente: a) na passagem entre 11min45s e 12min20s, a testemunha relata que passou uma semana com o dinheiro entregue pelo Prefeito antes de efetuar o pagamento. Ora, os pagamentos ocorreram em 04/08 (fls. 96/98). Se o dinheiro foi recebido uma semana antes, tem-se que tal entrega teria acontecido no final de julho. Fica, então, consideravelmente mais importante a divergência, que não é mais de só um mês, e sim de dois meses; b) confrontado com a divergência de datas, o depoente a reforçou, relatando que o candidato teria lhe dado o dinheiro quando "faltava um mês para a eleição" (16min40s-17min).

Há a possibilidade de que a confusão decorra da já referida condição sócio-cultural desfavorecida do depoente. Mas o fato é que, objetivamente, trata-se de contradição bastante relevante no que concerne às circunstâncias do fato, que induz a um estado de perplexidade sério. E tratando-se de uma cassação de diploma, há de se ter em conta que a prova, embora possa ter imperfeições, não pode ser problemática a esse ponto.

Vê-se, pois, que no único dos três casos em que foi apresentado um início de prova material, concorre este não para reforçar o alegado, mas para fragilizá-lo, gerando mais uma vez uma divergência objetiva de grande importância acerca das circunstâncias do fato imputado.

Por fim, em relação à imputação envolvendo a pessoa de Maria da Soledade da Silva Ferreira, há de se tecer as seguintes considerações.

Os representantes sustentam que está evidenciado em tal depoimento fato que caracteriza captação ilícita de sufrágio. Os representados, por seu turno, sustentam novamente haver contradições, primeiro em relação à pessoa que teria lhe entregado os R$ 40,00 iniciais, em segundo lugar, no que concerne às circunstâncias em que ela retirou a bandeira da sua própria casa, e, por último, no que se refere à ida dela à cidade de Santo Antônio para prestar declarações em cartório.

Observa-se que em juízo a testemunha relatou que, no mês de agosto, o prefeito chegou na casa acompanhado de outras pessoas e ofereceu R$ 800,00 para que a depoente e seu marido votassem nele e pusessem a bandeira dele na casa, o que foi aceito após conversa entre os cônjuges. Informou a testemunha que recebeu na hora R$ 40,00, ocasião em que foi aposta a bandeira favorável ao candidato, e que dias depois recebeu os prometidos R$ 800,00, entregues pela pessoa de "Carlinhos Tobias" , correligionário do prefeito, o qual foi até a sua casa de carro, por volta de onze horas da noite, e deixou o dinheiro, todo em notas de R$ 50,00 (06min40s-08min50s).

A parte representada aponta aí uma contradição: em cartório e no início de seu depoimento em juízo a testemunha teria dito que teria recebido os R$ 40,00 do Prefeito, ao passo que em momento seguinte, aos 09min04s, relatou ter recebido a quantia da pessoa de "Carlinhos Tobias" .

Há de se ter em conta, porém, que não foi só aos 09min04s que a testemunha fez o relato de que recebeu o dinheiro das mãos de Carlinhos Tobias. Convém transcrever o seu depoimento no trecho a partir dos 06min40s até os 07min56s:



¿... quando ele chegou na minha casa - eu moro lá na Zona Rural - Alexandre Justino com o pai dele e o pessoal que era com ele, chegou na minha casa e perguntou se eu queria a quantia de R$ 800,00 para botar a bandeira e votar no 40; aí a gente combinou, eu com meu esposo, e aceitou os R$ 800,00 dele, no mês de agosto; no dia que eu recebi o dinheiro foi no mês de agosto; (¿); na hora que foi combinado, já na hora ele me deu R$ 40,00, na hora; (¿); Alexandre Justino; (¿), ele deu o dinheiro pra um candidato a vereador que tava com ele, nem era candidato a vereador, era esposo de uma vereadora que apoiava ele, que se chama 'Carlinho Tobias', aí ele deu R$ 40,00; e os outros R$ 800,00 que foi combinado com ele era pra ele me pagar acho que no mês seguinte que foi o mês de agosto, no dia 10 de agosto foi a data combinada pra me dar o dinheiro"



Vê-se, portanto, que desde o início do seu depoimento em juízo é sustentado que o candidato à reeleição representado entregou os R$ 40,00 por intermédio de "Carlinhos Tobias" , o que foi apenas ratificado aos 09min05s. E isso não é de forma alguma incompatível com o teor da declaração de fl. 25, no trecho em que é dito que "na hora do acordo o prefeito só deu R$ 40,00 (quarenta reais) a mesma" , afinal, segundo a narração da testemunha em juízo, o prefeito estava no local e deu o dinheiro a 'Carlinhos Tobias' para que este o repassasse à eleitora. A dizer, na narrativa feita em juízo, 'Carlinhos Tobias' não é mais que um intermediário do prefeito, sendo este último quem, no fim das contas, deu o dinheiro. Ademais, impõe-se destacar que se trata de pessoa que informou que não sabe ler e que o documento não foi lido após prestadas as declarações e antes de sua assinatura no Cartório (02min20s).

Observe-se, ademais, que a descrição da posterior entrega dos R$ 800,00 é feita de forma perfeitamente detalhada, sem contradições ou inconsistências: numa certa noite "Carlinho de Tobias" foi de carro até a casa da depoente e entregou os R$ 800,00, "todo em notas de R$ 50,00" (08min00s-08min50s)

As contradições relevantes que efetivamente existem no depoimento não dizem respeito às descrições do ilícito, mas aos fatos posteriores. Quando questionada se a bandeira permaneceu afixada em sua residência até o dia da eleição, a testemunha respondeu que não, que tirou a bandeira porque teve raiva do pai de Alexandre (14min), tendo isso acontecido no final de agosto (16min42s). Demonstrou hesitação e falta de clareza ao explicar o porquê dessa raiva e se contradisse quando descreveu sua própria reação, primeiro dizendo que derrubou a bandeira assim que soube que o pai do candidato - o Sr. "Dedé Justino" , presente em todos os três relatos como partícipe ou protagonista das captações de sufrágio - estaria falando mal de seu marido (15min40s), e depois afirmando que só o fez uns quinze dias depois de saber disso (16min50s-17min10s).

Outro ponto inverossímil no depoimento de Maria Soledade da Silva Ferreira - e nisso tem grande semelhança com o depoimento de Márcio Silva Lins - é a insistência na afirmação de que foi ao 2.º Ofício de Notas sozinha, sem colaboração ou condução pelos representantes ou por pessoa a eles ligada. Ora, os próprios representantes afirmaram na inicial que receberam os relatos dos populares relativos à compra de votos, "o que corroborou para colher os depoimentos trazidos a lide no 2.º Ofício de Notas de Santo Antônio/RN" (fl. 03). E Francisco Maristote Silva dos Santos relatou com total clareza que foi levado ao tal Cartório pelo irmão do representante Osivan, sendo que este acompanhou a tomada das declarações, inclusive lendo o documento de fl. 29 após este ser impresso, e levou a testemunha de volta a Lagoa Salgada.

Como interpretar essas contradições? Teriam ela o condão de atingir também os fatos narrados anteriormente, consistentes na compra dos votos da depoente e seu marido pelo Prefeito? Significariam que o depoimento todo é uma fraude?

Primeiro, há de se ter em conta que, em tese, é perfeitamente possível que a testemunha tenha sido verdadeira ao descrever a captação ilícita de sufrágio e não tenha sido verdadeira quanto aos demais pontos, do mesmo modo como é admissível conceber que tenha mentido o tempo todo. É possível, por exemplo, que a narrativa da captação ilícita de sufrágio seja verdadeira e que a explicação para os dois conjuntos de contradições - o relativo à retirada da bandeira e aquele concernente à sua ida ao Cartório de Santo Antônio - consista numa espécie de tentativa de esconder algum tipo de aproximação posterior com os representantes, o que não seria muito de estranhar: um eleitor disposto a vender seu voto pode ser mesmo bastante volátil...

E o fato é que há indícios de que a possibilidade acima aludida corresponda à realidade dos fatos. Esses indícios consistem especialmente na "ruptura" posterior com os representados descrita pela testemunha - que inclusive é ponto comum nos três depoimentos. Narrou ela ter retirado a bandeira de casa motivada pelo fato de ter chegado ao seu conhecimento que o pai do candidato representado estaria a dizer que o marido dela iria "bancar covardia" , ou seja, não iria manter a bandeira dos representados em casa conforme negociado anteriormente (14min50s-15min40s). Há de se fazer aqui o retrospecto: Márcio Silva Lins relatara que depois apagou o número 40 pintado na sua casa, seguindo-se a estranha informação de que sobreveio a pintura do número 15, de responsabilidade não dele, mas da sogra dele. Por sua vez, Francisco Maristote Silva dos Santos relatou ter sido abordado após o dia da eleição pelo pai do candidato representado, Sr. Dedé Justino, o qual lhe cobrou agressivamente a devolução do dinheiro dado pelo filho ao referido eleitor, alegando que este não teria dado o voto negociado.

O que nos convence definitivamente de que no caso de Maria Soledade da Silva Ferreira ocorre justamente isso - uma narrativa verdadeira de uma captação ilícita de sufrágio permeada de contradições sobre os fatos subsequentes decorrentes de uma tentativa de esconder alguma outra coisa - é um conjunto de quatro aspectos do seu depoimento: a) a coerência e harmonia dos relatos da captação de sufrágio em si, de que já se falou linhas acima, e nesse ponto o seu depoimento está em um patamar claramente superior aos outros dois; b) o fato de que foi alertada, durante o depoimento, de que estava a admitir, ela própria, a prática de um crime, sem que disso tenha decorrido qualquer retratação (11min35s-12min40s): nesse ponto, impõe-se salientar que, de fato, não haveria lógica em a testemunha inventar algo e sustentar a mentira depois de cientificada de que está a prejudicar a si mesma perante a Justiça, admitindo falsamente a prática de algo que pode lhe acarretar uma posterior condenação; c) a circunstância de que nada há nos autos que aponte que a motivação de sua fala seja mera preferência política pelos representantes e vontade de beneficiá-los: a testemunha não foi contraditada; nada foi sequer alegado, muito menos provado, quanto a eventuais ligações partidárias ou de qualquer outra índole de sua pessoa ou mesmo de sua família com os representantes, o que torna ainda mais improvável que tenha sustentado a confissão de venda de voto pelo simples desejo de favorecer os candidatos derrotados.

Em vista disso, reconheço como devidamente provada a captação ilícita de sufrágio praticada pelo representado Alexandre José da Silva Freire em relação à pessoa de Maria Soledade da Silva Ferreira, ao passo que reputo não provada suficientemente a mesma prática em relação aos outros três eleitores mencionados na inicial.

Como consequência, impõe-se a diplomação dos candidatos que obtiveram a segunda colocação no pleito. Isso em virtude da circunstância de que os candidatos que têm seus diplomas cassados por este ato obtiveram menos de 50% dos votos válidos (precisamente 47,65%, conforme extrato anexo), o que afasta, a contrario sensu, a incidência do art. 224 do Código Eleitoral. Essa é a orientação consolidada na jurisprudência, malgrado as reservas pessoais deste magistrado a respeito, consoante se extrai dos seguintes julgados:



¿Recurso especial. Cassação de diploma. Art. 41-A da Lei nº 9.504/97. Eleições municipais. Prefeito e vice-prefeito. [...]. Anulação dos votos válidos. Não-inclusão dos votos nulos. [...]. 3. Votos nulos não se confundem com votos anuláveis. Estes são reconhecidos a priori como válidos, mas dados a candidato que praticou captação ilícita ou abuso do poder político e econômico durante o processo eleitoral. 4. A jurisprudência deste Tribunal consagrou como válidos, mas suscetíveis de anulação posterior, decorrente da aplicação do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, os votos obtidos por candidato infrator, por refletirem uma vontade orientada à escolha de um mandatário político. Não se somam a estes, para fins de novas eleições, os votos nulos decorrentes de manifestação apolítica do eleitor, no momento do escrutínio, seja ela deliberada ou decorrente de erro. [...]. 5. Anulados menos de 50% dos votos válidos, impõe-se a posse do candidato segundo colocado, e não a aplicação do comando posto no art. 224 do Código Eleitoral. 6. Recurso especial eleitoral parcialmente conhecido e não provido."

(Ac. de 17.8.2006 no REspe nº 25.937, rel. Min. José Delgado.) 

III - DISPOSITIVO



Ante todo o exposto, julgo:

a) procedentes, com efeitos imediatos, os pedidos de cassação dos registros de candidatura e diplomas dos representados, declarando nulos os votos obtidos pelos mesmos no pleito eleitoral de outubro de 2012, em vista da prática de captação ilícita de sufrágio, em razão do que lhes aplico, cumulativamente às cassações, pena de multa no valor total equivalente a 06 (seis) mil UFIRs;

b) procedente o pedido de declaração de inelegibilidade dos representados ALEXADRE JOSÉ DA SILVA FREIRE e JANÍLSON DANTAS FREIRE pelo prazo de oito anos a contar de outubro de 2012, com efeitos a partir da confirmação desta sentença por órgão colegiado da Justiça Eleitoral (arts. 1.º, I, "j" e 15, caput, da LC n.º 64/90) ou de seu trânsito em julgado;

Sem condenação ao pagamento de custas e honorários.

Aprazo sessão de diplomação dos candidatos integrantes da chapa classificada em segundo lugar para o dia 27/06/2013, às 10h00min.

Oficie-se ao Presidente da Câmara Municipal de Lagoa Salgada para que dê posse aos segundos colocados tão logo estes sejam diplomados.

Remetam-se cópias dos autos ao MPE para apuração de possíveis infrações penais.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se (DJe). Ciência ao MPE.

Monte Alegre/RN, 21 de junho de 2013.



MARCOS JOSÉ SAMPAIO DE FREITAS JÚNIOR

Juiz Eleitoral

FONTE:
http://www.tre-rn.jus.br/servicos-judiciais/acompanhamento-processual-e-push-1

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