Foto: Eduardo Naddar / Agência O Globo
Atraída pelo anúncio de roupas e acessórios importados a preços tentadores, em um banner num portal de notícias, a carioca Leyla Maria Peixoto Martins não pensou duas vezes. Clicou na propaganda, que a levou ao site lojaswikee.com.br. Era início de dezembro, e as ofertas eram tão boas — como uma camisa polo Ralph Lauren que no exterior custa US$ 85, cerca de R$ 255, por R$ 89,90 — que resolveu comprar presentes de Natal para a família. Gastou R$ 1.188, pagos por meio de boleto bancário. Nunca recebeu os produtos e, há alguns meses, o único canal de comunicação com a loja, um e-mail informado no site, foi desativado. Não conseguiu reaver o dinheiro.
— Eu não costumo fazer compras em sites, mas naquela correria pré-Natal, resolvi facilitar a minha vida. E deu nisso — lamenta.
Como Leyla, milhares de consumidores brasileiros são vítimas de sites que vendem, mas não entregam. Quase 500 desses endereços virtuais integram uma lista criada pelo Procon-SP, atualizada periodicamente a partir de reclamações, que deve ser consultada antes de se fechar qualquer compra na web. São lojas on-line que precisam ser evitadas porque vendem o produto, não entregam e não são localizadas para uma negociação nem pelo consumidor, nem pelo Procon-SP.
Desde a criação da lista, em 2011, o número de sites incluídos cresceu mais de dez vezes, pulando de 44 lojas virtuais brasileiras para 472 atualmente. A lista foi criada por causa da explosão do comércio pela internet, com muitas pessoas comprando pela primeira vez, explica Fátima Lemos, assessora técnica do órgão. Naquele ano, o Procon-SP registrou o pico de reclamações sobre falta ou demora de entrega de produtos comprados pela web: 20.379 queixas. No ano passado foram 12.793.
— O grande problema é que a maioria dessas lojas dá os maiores descontos no pagamento por depósito ou no boleto. E dessa forma é impossível reaver o dinheiro, caso a entrega não ocorra — explica Fátima.
Para Pedro Guasti, diretor executivo da E-bit, consultoria de compras on-line, o número de sites que aplicam golpes é irrisório.
— No Brasil temos entre 40 mil e 50 mil lojas virtuais ativas, com CNPJ. Então, estes sites que devem ser evitados representam 1%. É um índice muito pequeno dentro desse universo que movimenta R$ 40 bilhões com cem milhões de pedidos por ano, mas tem gente que gosta de correr riscos — diz.
Não é tão simples, porém, identificar um site que não vai cumprir com a oferta. Até porque, explica a assessora do Procon-SP, nem todos foram criados para aplicar o golpe e têm indícios claros de fraude, como produtos a preços muito abaixo dos praticados pelo mercado. Há os que são bem estruturados e trazem todas as informações que um site de vendas deve ter:
— Alguns são colocados no ar por empreendedores que não tinham noção da demanda, não deram conta de realizar as entregas por falta de estrutura logística ou mesmo de estoque e desaparecem, lesando os clientes.
Outra forma de identificar que o site trará problemas é se ele não informa e-mail e telefone de contato válidos, um endereço físico, do escritório ou de depósito, e o CNPJ. Estas informações são obrigatórias, de acordo com o Decreto do Comércio Eletrônico, em vigor há dois anos, lembra Ricardo Theil, coordenador de Segurança da Camara-e.net.
NOVOS INTERNAUTAS
Segundo o Procon, metade das reclamações sobre esses sites são de moradores de fora da capital, que acabam comprando pela internet, porque não teriam acesso a uma gama variada de produtos, não fosse a web. Theil acrescenta, ainda, que o perfil das vítimas dos sites desonestos são pessoas que têm pouca habilidade com a internet, que estão começando a usá-la agora. Mas há exceções, como os milhares de consumidores lesados pela Lu Cunha Store (lucunhastore.com.br), já fora do ar, incluída na lista do Procon-SP há dois meses.
No começo do ano passado, uma turma de celebridades começou a postar em suas contas em redes sociais fotos com produtos da loja virtual, como forma de propaganda. Os artistas deram credibilidade, e a marca ganhou milhares de clientes pelo Brasil. Uma delas foi Tania Bloise, moradora da Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio. Há um ano ela pagou R$ 1,8 mil por um iPhone que nunca chegou à sua casa. Hoje, é uma das 1,2 mil integrantes de um grupo criado no Facebook por consumidores lesados pela loja para trocar informações sobre as compras e tentar reaver o dinheiro pago. A maioria comprou produtos da marca Apple, por valores acima de R$ 1 mil. Todos os e-mails e telefones para contato informados estão desativados e, segundo os lesados, a dona da loja virtual se mudou para os EUA.
— A loja era divulgada por artistas famosos que ganhavam para isso, a página tinha CNPJ, telefone de contato. Não tinha como desconfiar. Inicialmente, quando reclamava sobre o atraso na entrega diziam que os produtos que vendiam (equipamentos de telecomunicações) precisavam de homologação da Anatel para funcionar no Brasil, e esse desembaraço demorava. Mas depois, perdi o contato. Pra mim ficou a lição. Compra agora, só na loja. Nada de site — conta Tania, que até hoje não conseguiu juntar dinheiro pra comprar um novo aparelho.
O advogado especialista em defesa do consumidor Vinicius Zwarg explica que, quando o pagamento é feito por meio de boleto ou depósito bancário, a dificuldade de reavê-lo é muito grande, porque é difícil encontrar o representante legal da empresa. Por isso, o ideal é sempre realizar o pagamento por meio de cartão de crédito. Pois, em caso de golpe, a administradora do cartão pode ser acionada e, ao comprovar ilegalidade, estorna o que foi pago e suspende as demais parcelas.
COMPRA NO CARTÃO PODE SER ESTORNADA
O coordenador do Comitê de Segurança da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs), Henrique Takaki, explica que o consumidor deve informar ao banco emissor do cartão sobre o não recebimento da compra por meio do SAC e de uma carta textual. Então, é investigado com a credenciadora (Cielo, Amex, Rede, por exemplo), que é quem tem contrato com a loja, se a entrega realmente não foi feita. Em caso positivo, o consumidor é reembolsado.
O artigo 7° do Código de Defesa do Consumidor prevê, ainda, que todos os causadores do dano respondam solidariamente pela reparação ao consumidor. O que pode levar, por exemplo, buscadores e sites de comparação de preços que exibem ofertas desses sites a serem responsabilizados, caso o consumidor opte pela compra, por meio dessa pesquisa, e não receba o produto. No entanto, o advogado Zwarg alerta que essa é uma discussão judicial e que não há um entendimento pacificado pelo Judiciário sobre de quem é a responsabilidade pela reparação:
— Cada caso é analisado individualmente. Agora, as administradoras de cartões têm responsabilidade direta e condições de auxiliar no gerenciamento desse estorno, pois podem pedir o travamento da remessa do valor.
Rodrigo Borer, CEO do Buscapé Company, que administra os buscadores Buscapé e Bondfaro explica que, como foi classificado pela Secretaria Nacional do Consumidor como prestador de serviços de internet, porque não intervém na cadeia de consumo, não pode ser responsabilizado por “eventual frustração do negócio realizado entre o comprador e o vendedor”. O GLOBO tentou contato com os sites Lu Cunha Store e Wikee, mas não obteve retorno.
PREVINA-SE
Referências: se você não conhecer a empresas e não tiver referências boas do site, não compre
Preços: sempre desconfie de preços muito abaixo dos praticados no mercado
Dados obrigatórios: verifique se a loja informa o endereço físico, telefone, CNPJ e e-mail. Teste os canais de comunicação da loja antes da compra
CNPJ: por meio do CNPJ da empresa, verifique no site da Receita (http://bit.ly/Q6dOrX) a situação cadastral dela. Se estiver “baixada”, “cancelada” ou “inativa”, desista da compra
Endereço: confirme se as páginas que exigem dados pessoais para a compra iniciam por https:// e se o cadeado está ativado (ícone amarelo numa extremidade da página)
Documentos: salve ou imprima todos os passos da compra, inclusive e-mails de confirmação
O Globo
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